domingo, 24 de julho de 2011

O título

O meu Blogue chama-se "Telhados de Zinco"!

Telhados de Zinco é a imagem mais marcante que guardo da primeira vez que viajei até África e sobrevoei Luanda. Do topo, ainda a grande altitude, conseguia apenas ver duas superfícies imensas, que virtualmente se encontravam num ponto de clivagem, e ambas reflectiam o Sol, mas de modo diferente, uma mais intensamente que a outra. Uma era o Oceano - não tinha qualquer dúvida!

Só na troposfera consigo perceber que uma das superfícies apenas forma um continuum por ilusão face à distância: são os Telhados de zinco dos Musseques de Luanda. Debaixo de uma folha de Zinco há vida, há diversas vidas e famílias que se abrigam numa frágil estrutura a que chamam Casa.

Ironicamente, tinha deixado Portugal depois de ter trabalhado num projecto de aplicação do Regulamento do Comportamento e Conforto Térmico de Edifícios, e agora eis que o elemento edificado onde vive mais de metade da população que encontro se reduz basicamente a uma folha de zinco sobreposta a quatro paredes de adobe e sobre o zinco, meia dúzia de calhaus convencem-na a não voar.

Poderia ter-lhe chamado "Telhados de vidro", porque também os tenho, ou "Sem telhados" porque tantas vezes vivo assim, mas o telhado de zinco, guarda em mim um infindável conjunto de memórias sobre o meu percurso por África, algumas das quais já partilhei, mas tantas outras que tentarei deixar a nu...

Até já!

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Bernardo - o taxista e o tempo

O Pedro tinha-me ligado, cerca da meia-noite. Não se estreava no feito de me telefonar na véspera e apenas impor a hora a que partiríamos no dia seguinte. Nem sequer percebi o nome do destino, apenas a hora da alvorada e, no final, penas disse: Combinado!

Ás sete em ponto, o Bernardo já estava na recepção do Hotel, saudei-o e pedi-lhe que esperasse uns minutos apenas. Senti pela primeira vez frio em Maputo, e regressei ao quarto para vestir um agasalho.

O Bernardo é taxista. É hábito meu brincar com ele e dizer-lhe que vou torná-lo o taxista mais responsável de Maputo, mais cumpridor dos horários que os clientes impõem, etc, etc. Um taxista pode ser muito mais do que um motorista, e o Bernardo é ainda mais que essa função. (Todos somos muito mais do que funções, certo?)

Recordo-o ainda no meu primeiro dia de chegada ao aeroporto de Maputo, quase encoberto por dezenas de outros com interesses como os dele, que se sobrepoem e se empurram desordeiramente para alcançar o passageiro com a referência que trazem, ou o cliente que precisam para, pelo menos, garantir a refeição do dia.

No meio de tantos aparentemente como ele, tento fazer um apelo a minha capacidade de observação, e só aquele rapaz de sorriso condescendente, que segurava um papel rude e sujo, onde mal se distingue o meu nome, poderia ser o Bernardo. Em Lisboa, muito provavelmente este nome sugeriria de imediato que fosse um qualquer taxista da Linha, ou arredores, e mormente, estou certo que tantos teriam tanto a aprender com o Bernardo...

Não me recordo de em nenhuma vez que tenhámos combinado um horário, que o mesmo tenha sido cumprido, no entanto e, mais uma vez reinicio o conflito com o tempo de África. O tempo é muito relativo, e aqui ainda é mais, e então porque é que o relógio do Bernardo teria que ser o meu?

Nos primeiros dias a minha expectativa era elevada para fazer cumprir a pontualidade, e de resto raramente os meus reparos nesse sentido produziriam efeito. Hoje estou praticamente conformado, as coisas acabam por acontecer no tempo, no tempo em que têm de acontecer, não só por estar numa vida diferente, não só por ter uma vida diferente, agora.

Sempre, na Europa, me imprimiram um ritmo alucinante, e tantas vezes dei por mim a correr, mesmo ao encontro do tempo livre, mesmo ao encontro da areia e do mar, ainda que tivesse a confirmação de que mesmo que me atrasasse, eles ainda permaneceriam lá.

Aqui, neste mundo, sinto até uma certa impotência, quando tento impôr minha própria velocidade, o meu cronómetro, mas o tempo não me pertence, já não me pertence, nem sequer os sítios...

(Seria neste post que explicaria o sentido do título do meu Blogue? E já agora, "Blogue" existe?)

terça-feira, 14 de junho de 2011

O título

Alguém me terá questionado sobre o título do meu blogue. De facto, será sensato traçar um pequeno argumento que o justifique, não que muitas vezes um título possa ter necessariamente uma ligação muito forte com o conteúdo, mas, enfim fará sentido que coexistam ou pelo menos que nos trasmitam uma sensação de convergência.

Os títulos, as capas, as texturas, os cheiros, as formas são propriedades que eu prezo muito quando toco um livro, e muitas das vezes funcionam para mim como um convite para inicar a sua exploração, mas um blogue não tem cheiro, não tem textura e não tem alma.

Muitas vezes vejo-me a olhar para esta estranha forma de vida, tal como uma causa virtual (ou uma coisa virtual) e de resto quero acreditar que me aproxima do que gosto, de quem gosto. Talvez por estar longe, qualquer meio sirva para me aproximar do mundo que quero ter sempre comigo, e isso possa provavelmente mitigar o meu cepticismo em relação a esta interface.

Mas a minha relação com a tecnologia sempre foi uma espécie de ligação amor-ódio, da qual eu dependo necessariamente, mas da qual eu me desprendo também sem saudade. Adoro a ficção científica, a animação, os efeitos virtuais, a espetacularidade de uma vista ou plano com mais uma dimensão, adoro a representação ou a projecção virtual da realidade, mas depois invado-a, confronto-a, desmantelo-a como que se estivesse a praticar um exercício reverso para me covencer de que ela é necessária...

Mas, era sobre o título que queria falar, e entretanto o tempo passou....assim, terei uma nova oportunidade para construir mais um post...